Tratamento das alterações no processamento auditivo central



Claudia Taccolini Manzoni
Fonoaudióloga, especialista em Audiologia


A alteração de processamento auditivo é uma dificuldade em compreender a informação que chega à via auditiva. A capacidade de escutar está preservada, porém a habilidade em interpretar e compreender os sons que chegam até nós está comprometida. Esta inabilidade em analisar os sons dificulta a compreensão da mensagem interferindo principalmente em ambientes ruidosos ou em situações da fala rápida ou baixa.

A criança com alteração do processamento auditivo pode apresentar:

  • Falta de atenção
  • Dificuldades de memorização
  • Vocabulário restrito
  • Dificuldade na leitura e escrita
  • Trocas de fonemas na fala ou na escrita
  • Dificuldade de compreensão
  • Dificuldade de aprendizagem
CONCEITUAÇÃO
O processamento auditivo refere-se a uma série de mecanismos fisiológicos que ocorrem no sistema auditivo periférico e central que o indivíduo realiza ao lidar com informações sonoras, analisando e interpretando-as, permitindo assim adquirir conhecimento por meio da audição.
A cóclea, órgão sensorial da audição, encontra-se madura ao redor da 20ª semana de gestação. No entanto, há uma gradativa diferenciação e especialização da forma como respondemos aos sons, em função do processo de maturação do sistema nervoso e das experiências auditivas que vão sendo vivenciadas. Para o completo desenvolvimento das habilidades perceptuais auditivas envolvidas na compreensão de linguagem, a neuromaturação estende-se até por volta dos 12 anos de idade.
TRANSTORNO DO PROCESSAMENTO AUDITIVO
A alteração do processamento auditivo ou transtorno do processamento auditivo é uma dificuldade em lidar com as informações que chegam via o sentido da audição. Assim, há uma boa capacidade de detectar sons, mas existe dificuldade com a clareza desses sons. Esta inabilidade de analisar e interpretar sons ocasiona:
  • Incerteza com relação ao que se ouve;
  • Dificuldade para entender na presença ruídos de fundo;
  • Dificuldade para seguir ordens oralmente;
  • Dificuldade para compreender fala rápida ou degradada;
  • Dificuldade para discriminar e identificar sons de fala.
A alteração do processamento auditivo pode estar associada a problemas na articulação da fala, expressão oral, trocas de letras na escrita, compreensão de leitura e até mesmo com o aprendizado de línguas estrangeiras.

MANIFESTAÇÕES:
  • Comportamento auditivo: resposta inconsistente a sons;
  • Dificuldade de localizar sons no espaço;
  • Desconforto a sons intensos;
  • Demora a responder quando chamado;
  • Compreensão de fala: fala muito “hã?”, “quê?”, principalmente em ambientes ruidosos ou reverberantes;
  • Dificuldade na compreensão de piadas e/ou palavras de duplo sentido.

REPERCUSSÕES

  • Todas as áreas da linguagem: articulação/fala, prosódia, vocabulário, semântica, sintaxe, uso de regras gramaticais, leitura/escrita, aquisição de língua estrangeira;
  • Comportamento social: distraído, desatento, agitado ou muito quieto, tendência a isolar-se, baixa autoestima;
  • Outras: memória, aprendizagem, habilidades de consciência fonológica, aprendizado da leitura e da escrita.
COMO É FEITA A AVALIAÇÃO:
A avaliação do processamento auditivo pode ser realizada em adultos, jovens e crianças a partir de 4 anos de idade e que têm o português como língua materna.
Para essa avaliação, é necessária a prévia realização da avaliação audiológica convencional, composta dos testes de audiometria, logoaudiometria e imitanciometria. A avaliação audiológica convencional deve ser recente ou repetida antes da avaliação do processamento auditivo. Este cuidado deve ser especialmente observado nos casos com histórico de otites de repetição e disfunção da tuba auditiva, freqüentemente associados a quadros crônicos de vias aéreas superiores.
A avaliação do processamento auditivo é composta por um conjunto de cinco a quinze testes, podendo ser necessário uma segunda sessão de avaliação. A seleção dos testes é baseada na maturação de sistema nervoso central esperada para a idade.
Os testes são realizados em ambiente acústico e os resultados comparados com os critérios de normalidade estabelecidos por Pereira & Schochat, 1997. São avaliadas habilidades perceptuais envolvidas no processamento da informação sonora pela via auditiva, como detecção, localização e lateralização, discriminação, reconhecimento, memória, aspectos temporais, fechamento (performance auditiva com sinais acústicos degradados) e figura-fundo (performance auditiva com sinais acústicos competitivos). A avaliação destas habilidades permite realizar inferências quanto à habilidade de compreensão de linguagem.

São testes especiais para avaliação do processamento auditivo, entre outros:
  • teste de localização sonora
  • teste de memória sequencial verbal
  • teste de memória sequencial não verbal
  • teste de fala com ruído
  • teste de fala filtrada
  • teste de fusão binaural
  • teste de identificação de sentenças com mensagem competitiva (PSI/SSI)
  • teste dicótico de dígitos
  • teste dicótico consoante-vogal
  • teste dicótico de dissílabos alternados (SSW em português)
  • teste dicótico não verbal
  • teste de resolução temporal/detecção de gap 
  • teste de padrão de frequência
  • teste de padrão de duração
Devem ser encaminhados para avaliação do processamento auditivo os casos que apresentarem queixa ou suspeita do transtorno de processamento auditivo, observando-se o quadro clínico e a presença de manifestações sugestivas.
PREVENÇÃO
Considerando a alta incidência da deficiência auditiva e a importância da audição no desenvolvimento de fala e linguagem, é crescente a realização da triagem auditiva neonatal em maternidades e berçários de risco. No entanto, é de fundamental importância realizar o acompanhamento do desenvolvimento da função auditiva e de linguagem em todas as etapas do desenvolvimento infantil, principalmente em crianças com indicadores de risco para o transtorno do processamento auditivo e em pré-escolares e escolares, devido à estreita relação com o aprendizado da leitura e escrita.

INDICADORES DE RISCO
  • Antecedente familiar de transtorno do processamento auditivo
  • Consangüinidade
  • Infecções congênitas: rubéola, sífilis, citomegalovírus, toxoplasmose, herpes e AIDS
  • Muito baixo peso (< 1500g) e/ou criança PIG
  • Asfixia
  • Hiperbilirrubinemia
  • Hemorragia peri intra ventricular
  • Meningite 
  • Ventilação mecânica prolongada
  • Convulsões
  • Alcoolismo materno ou uso drogas psicotrópicas durante a gestação
  • Otites de repetição no primeiro ano de vida
Os bebês que apresentam algum dos indicadores de risco acima citados devem ser acompanhados periodicamente, sendo que são características sugestivas de transtorno do processamento auditivo nesta faixa etária:

  • Inconsistência de respostas para tons puros;
  • Incompreensão de ordens verbais;
  • Respostas exacerbadas a sons;
  • Aumento da latência de resposta aos sons;
  • Dificuldade de localização com acuidade normal;
  • Ausência de habituação a estímulos repetidos;
  • Reflexo cócleo-palpebral ausente com acuidade auditiva normal.
(RE)HABILITAÇÃO
A (re)habilitação do transtorno do processamento auditivo é baseada em princípios de neuromaturação e neuroplasticidade do sistema auditivo e o programa terapêutico fonoaudiológico engloba:
  • Treinamento das habilidades auditivas, treino auditivo formal;
  • Desenvolvimento de habilidades cognitivas;
  • Desenvolvimento das habilidades lingüísticas específicas e metalingüísticas;
  • Conhecimento das habilidades metacognitivas;
  • Adaptações no ambiente;
  • Uso de estratégias compensatórias.


O Grhau possui uma equipe de fonoaudiologia especializada em tratar as alterações do Processamento Auditivo através de uma abordagem que enfatiza o desenvolvimento das habilidades auditivas

A orientação familiar e escolar é fundamental para o sucesso do programa terapêutico, priorizando as modificações no ambiente e estratégias necessárias para o melhor desempenho da criança.

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